Antônio de Oliveira - Um barra-cordense a ser reivindicado

Ontem foi Newton Sá que para aqui veio, guiado por mão caridosa, hoje é Antônio de Oliveira, pobrezinho também, inclinado também para subir às regiões sublimes da arte, que está a merecer as vistas do governo e de todos os maranhenses em cujo peito ainda brilha uma centelha e são patriotismo, de todos aqueles que desejarem a restauração de Atenas”

(Folha do Povo, 7/12/1925)


Antônio de Oliveira (1911-2003)
         Assim se expressou a redação da Folha do Povo quando da chegada de Antônio Barbosa de Oliveira, com apenas 14 anos de idade, à capital maranhense, sobraçando “dois trabalhos seus de esculturas: um busto de Pedro II e a miniatura da estátua de Gonçalves Dias, feitos com aparelhos toscos, a machado e facão”.

Embora não se tenha afastado das “regiões sublimes da arte”, sua realização estética acabaria por eleger a literatura – mais especificamente a poesia e a ensaística – em contraposição à vertente escultórica.

Sendo um legítimo barra-cordense – pois Curador, povoado então pertencente ao distrito de Barra do Corda, onde nasceu, a 4 de março de 1911, só teria sua emancipação política em 1943, modificando o topônimo para Presidente Dutra – , é espantoso que seus conterrâneos até hoje não o tenham reivindicado, fato que acreditamos dever-se a puro desconhecimento, o que explica a omissão do seu nome nos seus principais compêndios e antologias.

De condição humilde, órfão de pai, aprenderá por conta própria as primeiras letras, continuando os estudos com um mestre-escola do interior. Fez o preparatório no Centro Caixeiral e, depois, no Liceu Maranhense, quando já residia no Anil, onde, segundo lembra Jomar Moraes, “fez estas três grandes descobertas: a Bíblia, Camilo Castelo Branco e o companheiro de leitura – Josué Montello, ao lado de quem integrou o grupo de alunos diletos de Antônio Lopes”. Acrescenta Jomar que ainda “participou do Cenáculo Graça Aranha, do Centro Maranhense de Artes e Letras e do movimento “Renovação”, que, de 1º.4.1942 a 7.4.1945, manteve o suplemento cultural Ressurgimento, no Correio da Tarde”.

Nédio do convívio das vastas leituras, lendo quase ininterruptamente os bons autores que ia encontrando na biblioteca da Faculdade de Direito de São Luís, onde era funcionário e quartanista, transfere-se para o Rio de Janeiro e passa a colaborar em jornais e revistas e a trabalhar como redator de publicidade, bacharelando-se em Direito no ano de 1949. Mediante concurso para o DASP, no qual foi classificado, chegou a assistente do Gabinete Civil da Presidência da República.

Clóvis Ramos, que irá incluí-lo em “Onde canta o sabiá”, identifica-o esteticamente entre os chamados “neo-simbolistas” ou “simbolistas retardatários”, ao lado de Eyder Pestana, Antônio Vasconcelos, Lucano dos Reis, Viana Guará e Almeida Galhardo, não obstante concluir que, a partir de “O carro de Dona Ana Jansen”, Antônio de Oliveira “se transferiu para o modernismo”. Pertenceu à Academia Maranhense de Letras e foi seu delegado junto à Federação das Academias de Letras do Brasil.

Dedicando-se sobretudo à ensaística, muito fez para difundir a obra do poeta conterrâneo Maranhão Sobrinho, de quem era devotado admirador e sobre quem escreveu importantes trabalhos, entre os quais destacam-se: “A Arte de Emendar em Maranhão Sobrinho”, “Maranhão Sobrinho, Poeta Injustiçado” e “Maranhão Sobrinho, o Poeta das Rosas”. Muito do que hoje se sabe sobre o autor de “Papéis Velhos”, devemo-lo à laboriosa pesquisa de Antônio de Oliveira. 

Faleceu em Niterói/RJ, a 26 de junho de 2003.


Trabalhos publicados:

 

            “Maranhão Sobrinho – Notas Biobibliográficas” – Rio, 1976;

            “Camilo no Maranhão e outros ensaios” – S. Luís, 1980.



CAMINHO DA PERFEIÇÃO

 

Quem me dera juntar todas as dores

Deste vale de lágrimas impuro,

Como um pária que encontra num monturo

Um punhado de joias ou de flores...

 

Que me trouxeste as mágoas padecidas

Por um milhão de poetas e de heróis,

Para eu dar o calor dos arrebóis

Às geleiras polares dessas vidas!

 

Se eu conseguisse o pranto derramado

Por todos os mortais desiludidos,

Por esses “humilhados e ofendidos”

Que a Sibéria da vida tem pisado;

 

Se todo o horror de um eletrocutado,

Dos que morrem nas forcas e na guerra,

Me fosse dado conseguir, – na terra

Eu seria o maior afortunado!

 

                                               (Da “Pacotilha”, S. Luís, 7/7/1938)

 

MARINHA

 

Sob o céu todo azul de turquesa molhada,

O mar freme e soluça. Ondas calmas, serenas

Ouvem-se, no ar parado e limpo, sons de avenas,

De guitarra amorosa e flauta apaixonada.

 

Passa um barco, de longe, a vela desfraldada,

Deixando no ar sutil, leve rumor de penas.

E abertas sobre o mar, agitam-se as antenas

Das asas de uma garça esbelta e descuidada.

 

O sol, medalha de ouro, imerge, pouco a pouco,

Na água rumorejante onde distingo apenas

O barulho do barco, a esbater, num som rouco.

 

Escurece. Ainda vejo a sombra de uma ilhota,

Mas fica-me a ilusão desse rumor de penas

Da asa branca da garça e dum voo de gaivota...

 

                                      (Da “Pacotilha”, S. Luís, 18/7/1938)

 

OLHOS

 

Olhos de virgens, claros, sedutores,

Que enlouqueceis os pobres namorados,

Meigos olhos divinos, sonhadores,

Que prometeis carícias e pecados!

 

Olhos azuis que despertais amores!

Negros olhos formosos, cobiçados!

Olhos castanhos, vivos, tentadores,

Que trazeis os mortais acorrentados!

 

Olhos da Mãe de Deus, olhos tristonhos!

Lânguidos olhos bêbados de sonhos,

Olhos de Madalena, olhos escuros!

 

Olhos de minha mãe, olhos benditos,

Perolados de pranto, olhos aflitos,

Sois os olhos mais lindos e mais puros!

 

                                   (Do livro: “Onde Canta o Sabiá” – Rio, 1972)

 

 


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